Em camundongos, substâncias cruciais preparam os macrófagos do sistema imune para combater células de tumor ascítico, observado in vitro.
Uma recente pesquisa realizada no Instituto Butantan revelou que a crotoxina, uma das toxinas encontradas no veneno da cascavel (Crotalus durissus terrificus), pode ter efeitos benéficos no combate ao câncer. Os resultados apontam para um potencial modulador da substância sobre o sistema imunológico, indicando possíveis avanços na busca por novas terapias contra essa doença tão devastadora.
Além disso, a descoberta abre novas perspectivas para o tratamento de tumores e outras formas de neoplasia. A crotoxina parece ter propriedades que podem contribuir para o combate eficaz contra essa doença maligna, representando uma esperança na luta contra o câncer.
A importância da imunoterapia no tratamento de câncer
Nesse tipo de tratamento são utilizadas substâncias ou feitas alterações nas células do sistema imune para induzi-las a combater tumores com mais eficiência.
Leia Mais Exercícios físicos podem ajudar pacientes com câncer de mama avançado Exame de sangue pode detectar câncer colorretal com 83% de precisão, diz estudo Câncer de cólon: colonoscopia é fundamental para o rastreamento e prevenção O estudo foi publicado na revista Toxins e contou com a colaboração de pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade de Ribeirão Preto (Unaerp). ‘Camundongos portadores de câncer que receberam uma pequena e única dose da toxina apresentaram prevalência de macrófagos que disparam substâncias cruciais para destruir células tumorais, como o óxido nítrico’, conta Camila Lima Neves, primeira autora do trabalho, realizado durante o mestrado no Programa de Pós-Graduação em Ciências-Toxinologia do Instituto Butantan. Mais do que demonstrar os efeitos da crotoxina sobre os tumores, os resultados desse estudo evidenciam como a ‘reeducação’ induzida pela toxina sobre o perfil do macrófago pode ser um caminho para adquirir uma resposta imune antitumoral suficiente e duradoura, reforçando a importância da imunoterapia.
No estudo, a administração da crotoxina nos animais portadores de tumor ascítico levou à prevalência dos macrófagos M1, um perfil pró-inflamatório mais adequado para inibir o desenvolvimento de tumores, enquanto os macrófagos M2, um perfil que favorece o tumor, estavam diminuídos. Trabalho realizado como parte do mestrado de Camila Lima Neves no Instituto Butantan mostrou como a crotoxina induz um perfil de macrófagos que combate tumores / Instituto Butantan/Divulgação ‘Estamos estudando formas e combinações estruturais da crotoxina para encontrar uma que seja menos tóxica e mais efetiva no seu efeito imunomodulador e antitumoral.
Resultados promissores na pesquisa com camundongos
Mas é possível que outras estruturas da molécula crotoxina, inclusive já conhecidas, possam realizar a mesma ação ou potencializar seu efeito’, completa Sandra Coccuzzo Sampaio, pesquisadora do Instituto Butantan e coordenadora do estudo, que integra projeto apoiado pela FAPESP. Para chegar aos resultados, os pesquisadores acompanharam dois grupos de camundongos por 13 dias. O primeiro grupo recebeu uma inoculação de células de tumor ascítico, um tumor líquido que se desenvolve na região abdominal. Os animais foram então divididos em três tratamentos: uma solução salina (grupo-controle), uma pequena dose de crotoxina (0,9 micrograma por animal) e uma dose maior da toxina (5 microgramas por animal). O segundo grupo foi de animais saudáveis que receberam apenas os três tratamentos, a fim de demonstrar o efeito da toxina num organismo sem câncer. Células de defesa ativadas Ao final do 13º dia de experimentos, a administração da menor dose da toxina (0,9 micrograma) nos animais com tumor ascítico levou à prevalência dos macrófagos M1 (antitumorais) em cerca de 60%, que foi a mesma porcentagem de células encontradas nos animais que não tinham tumor. O resultado mostra que o tratamento foi eficaz na manutenção dessas células de defesa no microambiente tumoral. A dose maior, por sua vez, levou a um aumento desse tipo dos macrófagos M1 e a uma diminuição dos macrófagos M2, demonstrando a capacidade que essa toxina tem de impedir células que favorecem o tumor.
Os efeitos da crotoxina no controle tumoral
No sexto dia após o tratamento com as diferentes doses de crotoxina, o volume do tumor havia diminuído significativamente nos camundongos portadores de câncer, quando comparado ao grupo que recebeu apenas uma solução salina. Porém, desse período até o final do experimento, apenas o grupo que recebeu a menor dose foi capaz de reduzir o volume do tumor, em 27%. Nos animais tratados com a menor dose da toxina, após seis dias da inoculação do tumor foram observados ainda redução no número total de células tumorais e aumento no número de leucócitos, que também são células de defesa, em comparação aos que receberam solução salina. ‘Isso mostra que a menor dose é suficiente para modular os macrófagos e reduzir o tumor. Esse dado é extremamente relevante, pois os efeitos antitumorais da crotoxina são conhecidos pela ação direta da toxina sobre as células tumorais. Por meio de estudos in vitro e deste trabalho, conseguimos demonstrar também a importância da ação imunomoduladora da crotoxina sobre os fenótipos de macrófagos, críticos para o controle tumoral. Por isso a necessidade de pesquisar novas combinações e reduzir possíveis efeitos tóxicos da molécula para o organismo’, explica Coccuzzo. A menor dose da toxina, ao final do 13º dia do tratamento, proporcionou ainda o aumento de 35% na produção de óxido nítrico pelos macrófagos dos camundongos com tumor, comparado com o grupo-controle, sem toxina. O que recebeu a maior dose de crotoxina não teve mudanças nesse parâmetro. O óxido nítrico é um radical livre importante na defesa contra tumores, pois penetra na célula tumoral e a leva à destruição. ‘Este é o primeiro trabalho demonstrando como uma única administração de crotoxina interfere na reprogramação de macrófagos, favorecendo o perfil mais desejado quando há a instalação do tumor, pois controla eventos da progressão tumoral’, afirma Neves. ‘Uma evidência forte que observamos nesse trabalho foi a ação inibidora da crotoxina no volume do tumor e no número de células tumorais, além do estímulo da produção de mediadores pró-inflamatórios, cruciais para a ação antitumoral dos macrófagos’, encerra Coccuzzo. O artigo completo Crotoxin Modulates Macrophage Phenotypic Reprogramming está disponível em: www.mdpi.com/2072-6651/15/10/616.
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A importância dos macrófagos na luta contra o câncer
Fonte: © CNN Brasil
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