Gaúcho fala sobre arbitragem e curiosidades de musculação, opina sobre polêmicas do ofício em entrevista em Santa Maria.
O renomado árbitro Daronco possui uma incrível estatura de 1,88m e mais de 90kg. Apesar de sua imponência física, é conhecido por sua personalidade amigável, como destacado durante uma extensa entrevista em Santa Maria (RS), sua cidade natal. O gaúcho de 43 anos, filho de um alfaiate e uma costureira, compartilhou o seu objetivo de alcançar os 300 jogos no Campeonato Brasileiro.
Anderson Daronco, referência na arbitragem brasileira, é admirado por sua competência e imparcialidade. Com uma carreira sólida, o árbitro coleciona experiências e desafios que o consolidam como um dos melhores em sua área. Sua trajetória é marcada por grandes jogos e decisões acertadas, representando com excelência o profissionalismo no futebol.
Daronco: A trajetória de um árbitro apaixonado
Fã de Bebeto e Romário, da Geração de Ouro do vôlei de 1992 e de Ayrton Senna, ele virou árbitro quase por acaso. Educadamente, avisou que não podia falar de lances específicos e nem de personagens que amanhã pode cruzar novamente.
A polêmica com Hulk e o reconhecimento do erro
Um deles, do caso que mais desperta memes e curiosidades, o atacante Hulk – que o criticou duramente em entrevista na beira do campo em julho de 2022. Daronco foi punido pelo STJD. Ele já apitou 37 jogos da Série A depois daquele episódio. Nenhum do Atlético-MG.
Os desafios e conquistas na carreira de Anderson Daronco
No futuro, com o livro que começou a escrever, perdeu o arquivo, mas está na cabeça, ele promete contar de tudo um pouco. Mas só quando encerrar a carreira.
– Não tem nenhuma caixa preta.
Mas dá para falar com um pouco mais de liberdade (depois de parar de apitar).
Ficha técnica:
- Nome completo: Anderson Daronco
- Nascimento: 5 de janeiro de 1981, em Santa Maria (RS)
- Carreira: formado em Educação Física pela Universidade Federal de Santa Maria, desde 1999 pertence ao quadro de árbitros da Federação Gaúcha de Futebol.
- Desde 2008 é da Seleção Nacional de Árbitros de Futebol (SENAF) da CBF.
- Desde 2014, é árbitro Fifa.
- Mais de 230 jogos apitados na Série A do Brasileiro e já atuou em diversos jogos de Libertadores e das Eliminatórias sul-americanas para Copas.
- Eleito melhor árbitro do Campeonato Brasileiro de 2015, em eleição da CBF
Abre Aspas: Anderson Daronco
ge: Você é nascido, criado e formado em Santa Maria. Como é a vida do Anderson Daronco por aqui? — Sou de um bairro chamado Itararé. Tive uma infância feliz, sempre pratiquei muitos esportes.
Chegava do colégio de manhã, almoçava e já saía correndo para a rua porque queria jogar bola. Às vezes jogava vôlei também. Eu tinha 11 anos quando teve a medalha de ouro nas Olimpíadas de Barcelona. Jogava handebol, taco também. Tenho muita saudade de jogar taco na rua. Sou o filho caçula, tenho quatro irmãs mais velhas e sou nove anos mais novo do que a minha irmã mais nova.
Fui a última esperança dos meus pais de terem um filho homem. A raspa do tacho, como dizem (risos). Era bom de bola?
— Eu nunca tive muita habilidade não, mas era muito inteligente para jogar. Futsal, principalmente.
Tinha muita força e inteligência para ocupar os espaços da quadra, mas no campo eu não tinha muito tempo de bola e confesso que eu era um zagueiro-volante que apelava. Eu deixei algumas cicatrizes em alguns jogadores (risos).
Seus pais também são de Santa Maria? — Sim. Os meus pais vieram da roça.
Na região de Santa Maria, a gente tem série de pequenos municípios que são de descendência italiana, de onde veio a família e meus avós. São da região que se chama Quarta Colônia de Imigração Italiana. Meu pai veio para Santa Maria com 18 anos para servir o quartel, para fugir da roça, né? Minha mãe veio junto.
O que eles faziam? — Meu pai foi a vida inteira alfaiate, um dos últimos alfaiates vivos ainda hoje no município de Santa Maria. Minha mãe é costureira. Trabalham até hoje, por mais que tenham uma idade avançada, com comércio aqui em Santa Maria. Você ajudava seus pais? — Eu ficava louco. Era comércio de bairro e a loja era anexa à casa.
Minha mãe muitas vezes pedia para eu cuidar da loja. Eu, criança, com 14, 15 anos, e cuidava da loja enquanto ela ia cozinhar o almoço, lavar alguma roupa. Algumas irmãs já moravam fora, só tinha uma que morava ali junto, mas ela trabalhava fora, então eu era o único que convivia o tempo todo na casa. Aí ia atendendo as pessoas assim que chegavam para comprar alguma coisa.
Recebia dinheiro, anotava. Eu ficava muito bravo com isso, porque era um tempo que eu podia estar na rua jogando bola, andando de bicicleta. Isso acho que acaba me marcando um pouco e acabou me afastando um pouco dessa parte de seguir os negócios da família.
Como você iniciou no curso de Educação Física que depois te levou à arbitragem? — Eu tive um grande professor no Primeiro Grau, que é meu amigo até hoje. Me espelhava muito nele. Também tinha um pai de um de um amigo meu de infância que dava aula no curso de Educação Física e eu frequentava muito a casa deles. Ele já era professor na Universidade Federal de Santa Maria.
Eu me lembro que queria ser como eles, eu já tinha essa paixão pelo esporte. Prestei vestibular e passei de primeira na Universidade Federal de Santa Maria. Foi quando acabei sendo apresentado à arbitragem. Como se tornou árbitro de futebol? — Eu nunca desejei ser árbitro de futebol. Minha única experiência com arbitragem até então, e não arbitrando e sim olhando, foi em 1998.
Teve um jogo da segunda divisão aqui na cidade, foi a primeira vez que eu fui num estádio de futebol. Claro que, sendo apaixonado por futebol, eu tinha meu time na infância, mas eu nunca tinha ido a um estádio assistir a uma partida de futebol. Fui ver Inter de Santa Maria contra o Guarani de Venâncio Aires. Quem ganhasse subia. O Inter de Santa Maria perdeu de 1 a 0.
Veio a subir num jogo que eu fui assistir também, no ano seguinte. Eles ganharam do São Paulo do Rio Grande também num jogo decisivo aqui em Santa Maria.
— Foram as únicas duas vezes que eu fui em um estádio assistir uma partida como torcedor ou sem o olhar de árbitro de futebol. E ali eu já via como as pessoas tratavam o árbitro, o bandeirinha. Via as pessoas na tela (grade).
Pareciam uns animais. Esbravejando, gritando e tacando mijo. Jogavam na própria torcida, xingavam a torcida do outro lado. Ali que eu comecei a pegar um ambiente de futebol.
Você reagia de alguma maneira? — Não, nunca debati. Eu só olhei e guardei para mim. Lembro também que tinha muita hostilidade com a presença feminina.
Era uma época em que as mulheres não iam tanto e as poucas que iam, quando levantavam para comprar uma coisa ou para ir no banheiro, a própria torcida xingava de tudo quanto é tipo. Xingavam quem era da própria torcida do outro lado, no pavilhão social, que é onde, teoricamente, senta quem tem condição de pagar ingresso mais caro.
Fui sendo preparado já sem saber de como funcionava um pouco esse clima de arquibancada. Você xingava o juiz também? — (Risos) Cara, tive alguma oportunidade. Mas eu não frequentava estádio, eu assistia muito pela TV.
Mas logo depois eu acabei fazendo o curso de arbitragem, logo em seguida dessa época e quando eu assistia a um jogo e eu acabava reparando num erro de um colega ou alguma coisa eu também sempre procurava me colocar no lugar. Via que era um erro, claro, mas procurava entender.
— Mas o meu pai xingava muito (risos).
Ele era daqueles que pensa que tem uma teoria internacional contra o time dele, sabe? Eu era completamente o contrário, eu olhava sempre assim, ‘você só pode estar ficando louco, tchê’.
Quando você falou ‘vou ser árbitro de futebol, vou seguir essa carreira’? — Não foi uma decisão que eu parei para pensar. Aconteceu naturalmente.
Eu estava no curso de Educação Física e fiz o curso só para cumprir uma carga horária que tinha lá de atividades complementares de graduação no curso. Só aquele curso de arbitragem matava metade dessas horas. A maioria dos meus colegas da minha turma, do meu semestre de faculdade, acabaram fazendo esse curso. Só que eu não tinha dinheiro.
E eu me lembro até hoje quanto custou certinho o curso de arbitragem naquela época. Era um valor o curso e mais um valor de um kit lá para apitar, ganhava uma meia, uma bermuda e uma camiseta. Quanto era? — O curso custava R$ 330 e o kit custava R$ 100. Isso lá em 1999. Eu não tinha essa grana, até que uma irmã minha bancou, ela e meu cunhado.
Tinha 18 anos, cara de guri, fiz o curso e meu grande interesse era no final pegar aquele diploma e registrar na coordenação do curso e dizer assim: ‘Não me incomoda mais com essa carga horária’. Mas durante o próprio curso realizei algumas práticas na faculdade. Tinha alguns jogos que te convidavam para apitar e já ganhava um troquinho.
Conheci pessoal da arbitragem aqui em Santa Maria e estava apto a atuar em jogos oficiais pela Federação Gaúcha de Futebol. — Inicialmente eu trabalhava muito em partidas de futebol amador, futebol de criança.
Saía no nosso inverno rigoroso aqui, numa época que não tinha telefone celular, não tinha nada, ia na sexta-feira, depois de receber a escala: ‘Olha, Anderson, tu vai trabalhar lá como bandeirinha no campo tal, jogo tal, 8h da manhã’. Aí no sábado chovia, domingo chovia, nem sabia se ia se ia ter jogo ou não. Ninguém te comunicava.
Aí chegava, não tinha ninguém no campo e, ‘opa, cancelaram o jogo’. E na época era para ganhar R$ 10, também me lembro até hoje. Era a taxa para esses jogos assim. Já era árbitro principal do jogo? — Não, eu comecei como bandeirinha. Eles achavam que eu tinha cara muito de guri, com 18 para 19 anos. Trabalhava nesses jogos, mais como necessidade mesmo.
Não tinha muita grana para comer na universidade. Às vezes ou não almoçava ou comia uma bolachinha recheada. O dinheiro da arbitragem já me dava a possibilidade de almoçar um pouco melhor na faculdade. Dava uma possibilidade de em vez de tirar cópia de um material do curso já poder comprar um livro.
Já dava oportunidade também de comprar um tênis mais legal, um dinheirinho para poder sair da noite e se divertir com a galera, já dava um certo ar de ir de independência. Tomou gosto, então… — Eu pensei: ‘Poxa, nessa fase que eu tô aqui, eu ganho X. Eu tô vendo aquele cara ali do meu lado, ele tá ganhando 2X porque já tá um bom tempo nisso.
Daqui um pouco ali na frente eu posso ganhar isso aqui, com possibilidade de ascender’. Fui tendo pequenos objetivos na arbitragem. — Meu grande sonho quando eu comecei na arbitragem não era apitar no Maracanã. Isso para mim era completamente inatingível. Principalmente por como funcionava a sistemática da arbitragem aqui no RS, em que o pessoal do interior era deixado em segundo plano.
— Os meus sonhos iniciais eram apitar jogo em Pelotas, em Caxias, era conhecer o estádio Bento Freitas, do Brasil. Conhecer o estádio Boca do Lobo lá do Pelotas. Conhecer o estádio do Juventude, do Caxias, aqui que eram situações mais fáceis de serem atingidas por mim.
E olha que tinha aqui ainda o Olímpico, o Beira-Irio, que que eu teria possibilidade de quem sabe de vir a apitar uma primeira divisão um dia, mas isso também era praticamente impossível.
— A primeira vez que eu pisei nesses palcos do nosso futebol aqui foi como se fosse a minha grande Copa do Mundo.
Depois fui colocando pequenos objetivos que eu felizmente consegui indo ultrapassar todos eles. Soube que você coleciona camisas de futebol. Tem quantas? — Ah, tenho bastante. Não consigo falar quantas, mas tenho bastante. Era um sonho de criança. Meus pais não tinham dinheiro para me dar a camisa. Não vou falar também, obviamente, as primeiras que eu tive (risos).
Mas é de praxe ganhar uma camisa aqui, outra ali. É situação completamente normal no meio dos jogos. Fui guardando, essa paixão foi se alimentando e hoje eu coleciono também camisas muito antigas dessa época de quando eu era criança nos anos 1980. Eu tenho contato com muitos colecionadores, quando eu vejo algo dessa época eu vou lá e cato.
Porque é um sonho lá de trás que eu vou conseguindo realizar. Além de hoje, é claro, também ter camisetas de grandes craques da nossa da nossa época. Você apitou jogo do Cristiano, do Messi. Pegou camisa deles? — Tenho do jogo da Arábia Saudita com o Cristiano Ronaldo. Eu fiquei conversando com ele no final do jogo. No jogo que ele reclamou de você, né?
— Isso até virou meme, né? As pessoas aqui no Brasil, acho que para ganhar alguns likes, criaram lá uma manchete: ‘Cristiano Ronaldo briga com Daronco’. Não brigou, não teve nada. O cara protestou por uma situação de jogo, assim como aqui no Brasileiro tem toda hora. Então os caras estão toda hora brigando comigo? E felizmente eu estava certo também na minha tomada de decisão (risos).
— No final do jogo a gente teve a oportunidade de conversar e falei que ficaria muito muito honrado se ele pudesse me presentear com a camiseta. Ele ainda assinou um par de cartões. Nesse jogo também acabei ganhando a camiseta do Firmino, que ele era do outro time. Dois grandes craques, um da nossa Seleção e um dos gênios da modalidade.
Os jogadores eu sei que ganham muito bem para atuar lá. E a grana para o juiz, foi boa? — Eu preciso voltar. Preciso voltar mais vezes (risos). Não chega nem perto do que os caras estão ganhando para jogar lá, na arbitragem a realidade é um pouquinho diferente. Foi de primeira classe no avião? — Sim, a viagem é boa.
Eu captei todos os chocolates que eu podia no avião. Eu sou tarado por chocolate. Eu queria de champanhe a
Fonte: © GE – Globo Esportes
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